Petróleo no Amapá: 'Deixar riqueza no solo com miséria na superfície é inconcebível'
Início da pesquisa na bacia da Foz do Amazonas pode adicionar 1 milhão de barris/dia à produção nacional. O desafio será transformar a riqueza em desenvolvimento social, evitando os erros da Guiana e Venezuela.
A Petrobras inicia uma fase crucial de pesquisa na Margem Equatorial brasileira, especificamente na bacia batizada de Foz do Amazonas. A área, localizada a mais de 500 km da foz do Rio Amazonas e mais apropriadamente descrita como margem do estado do Amapá, é vista como a maior fronteira de exploração de petróleo do país desde o pré-sal.
A expectativa em torno da região é justificada. Estimativas indicam um potencial de produção que pode ultrapassar 1 milhão de barris de petróleo por dia.
Para a economia nacional, o impacto seria profundo. O Brasil, que recentemente atingiu recordes de produção próximos a 4 milhões de barris/dia, veria sua capacidade aumentar em cerca de 25%. Isso consolidaria o país como um dos maiores produtores globais, aproximando-se de nações como Canadá e Iraque.
O Espelho da Guiana
O potencial econômico da Margem Equatorial é frequentemente comparado ao fenômeno da vizinha Guiana. O país, com um território pouco maior que o do Paraná e uma população de apenas 800 mil habitantes, experimentou a maior taxa de crescimento do PIB no mundo nos últimos anos.
Antes das descobertas de petróleo, a renda per capita da Guiana era de aproximadamente 6.000 dólares. Hoje, já se aproxima de 25.000 dólares – mais que o dobro da renda per capita brasileira (cerca de 10.000 dólares). O PIB do país saltou de 5 bilhões para 18 bilhões de dólares em um curto período.
Contudo, a Guiana também serve como um alerta. A explosão de riqueza não se traduziu, até o momento, em melhoria proporcional da qualidade de vida da população. Relatórios indicam que 58% dos guianenses vivem com cerca de 7 dólares por dia, e um terço com menos de 4 dólares.
A riqueza gerada pelo petróleo, em um país com baixa solidez institucional, tem ampliado a desigualdade, beneficiando principalmente executivos e empresas multinacionais, enquanto a miséria persiste.
O Desafio Brasileiro: Riqueza ou Maldição
A exploração da Margem Equatorial coloca o Brasil diante de uma escolha crítica, especialmente para a Região Norte, historicamente a mais pobre do país.
Atualmente, o Brasil arrecada entre R$ 60 e R$ 70 bilhões anuais em royalties do petróleo com a produção atual. Um acréscimo de 1 milhão de barris diários poderia injetar de R$ 15 a R$ 20 bilhões adicionais por ano nos cofres públicos, com grande parte destinada aos estados da região.
Esse capital, se bem administrado, tem o potencial de revolucionar a infraestrutura, a saúde e a educação locais. No entanto, o risco da "maldição dos recursos" – fenômeno visto na Guiana e, de forma mais catastrófica, na Venezuela – é real.
A Venezuela, dona da maior reserva de petróleo comprovada do mundo, viu sua produção despencar de quase 4 milhões para 1 milhão de barris/dia. Durante décadas de vasta riqueza petrolífera, o país falhou em distribuí-la, resultando em colapso econômico, miséria generalizada e a consolidação de um regime ditatorial.
A Necessidade da Produção
O debate sobre a exploração ocorre em meio à transição energética global. O petróleo, no ritmo atual de consumo, tem reservas estimadas para mais 47 anos, embora inovações tecnológicas e mudanças no consumo possam alterar essa projeção.
Ainda assim, o petróleo segue como a principal matriz energética do mundo. O consumo global per capita equivale a 2 litros diários por habitante, superando o consumo de qualquer outra bebida, incluindo água (em muitas métricas), leite ou café.
A perspectiva defendida por setores produtivos e analistas de desenvolvimento é que deixar vastas reservas de riqueza no subsolo, enquanto a miséria persiste na superfície, é uma escolha indefensável. O argumento central é que o progresso social e o combate à pobreza dependem da geração de riqueza.
O petróleo, responsável pelo nível de desenvolvimento tecnológico e conforto atual, continua sendo a ferramenta mais eficiente para gerar o capital necessário para transformar realidades sociais complexas, como a da Região Amazônica.
A tarefa do Brasil, portanto, não é apenas explorar e produzir, mas garantir que a institucionalidade do país seja forte o suficiente para transformar bilhões de dólares em desenvolvimento real, combatendo a pobreza e evitando que a riqueza se torne um fim em si mesma, como nos exemplos vizinhos.

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